Não sabendo ser outra coisa, não sabendo me fingir do que não sou, não tive opção que não fosse, muito cedo, me assumir: mulher. E é com tanto orgulho que hoje carrego em mim a força que esse assumir-se me trouxe, é com tanto orgulho que carrego em mim a linhagem daquelas que me antecederam… Sensíveis, sentimentais, temperamentais – sim, também, e talvez mandonas, até -, divertidas, batalhadoras, donas de si e fortes. Nenhuma delas, nem uma, sequer, frágil. Olho as de hoje, nascidas da mesma árvore, pares de mim, e sorrio: sensíveis, batalhadoras, fortes.
Uma vez ouvi de uma outra – não das que formaram a árvore de que sou fruto, jamais – que as submissas conseguem tudo o que querem e conseguem, não raro, quem as sustente e lhes dê “boa vida”. Boa?! Como se isso fosse conquista, como se pudesse haver coisa que valha desistir de si, desistir de colocar pegadas próprias no mundo em que se pisa… Verdade que conseguem o que querem? Não sei e não tenho vontade qualquer de experimentar. Se submetem-se, talvez em nome do sonho que a sociedade decidiu que devam sonhar, ao submeterem-se, submetem tudo o que existe em si e me pergunto o que é isso a que chamam querer, se seu querer original já se dobrou e encolheu, amarrotado no pacote de submissões. Seja lá o que chamam de conseguir o que querem, se o conseguem, de fato, desconfio que devam querer bem menos do que, desde muito cedo, as mulheres que formaram a árvore de que vim me ensinaram que posso querer e conseguir, com mérito e esforço meus, sem precisar submeter meu querer a ninguém. No tempo em que outras aceitavam todo dobrar-se como natural, já havia, origem de nós, a que não se dobrou e construiu seu caminho. Caminho visto, então, pelas que se dobravam, como torto, mas caminho visto pelas que a sucederam como reto, caminho que nos ensinou. Foi a sua coragem para a ruptura que nos ensinou.
A realização de meus quereres – a árvore de que vim me ensinou -, conquisto eu mesma e é isso o que me dá esse direito, de que hoje tanto me orgulho, direito de chamar cada uma de minhas aquisições – a maioria delas, imateriais aos olhos do mundo exterior – do que são: minhas conquistas, frutos de mim, frutos da árvore que me originou.
Arte: Tree of Life, Keith Mallett
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