É outono no hemisfério sul. Tomo emprestados, ao revés, os antigos ritos pagãos de primavera e planto minhas sementes, acreditando no equilíbrio entre dia e noite. Deixo que a natureza, generosa em sua sabedoria, me instrua. Celebro a mãe terra. Tempo de fazer podas necessárias, ainda que aparentemente violentas. Tempo de libertar a matéria semimorta que, malsã, permanecia por inércia, mas sem viço, sem cor, sem força. Tempo de agradecer ao que um dia pode ter sido vivo, mas não mais vivendo, deve partir, transmutar, abrir caminho para que a vida se renove, para que nova vida brote e novo ciclo se inicie. Tempo de preparar canteiros e esperar que, no inverno, quando os dias forem menos longos, mais cinzentos e frios, o resultado do plantio inspire força e traga esperança e calor. Tempo de ser feliz somente por poder plantar e pelo privilégio de ver a semente criar vida. Tempo de espalhar vida. Tempo de separar as mudas filhas de suas mães e permitir que cresçam, tenham vida própria, como deve ser. Tempo de podar raízes, tão necessárias, mas que, se longas demais, tomam todo o espaço, criam emaranhados, estrangulam, sufocam a si mesmas. Tempo de agradecer pelos nutrientes com que os outonos passados alimentaram a travessia de invernos. É outono e cada outono é um, mas cada um, sempre, tempo de recomeço.
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