Tem a história do gago que, depois de muito treinar com o fonoaudiólogo, saiu falando, sem tropeçar: “Atrás da pia tem um prato, um pinto e um gato. Pinga a pia, apara o prato, pia o pinto e mia o gato”. O problema passou a ser ele, gago, dali por diante, tentando enfiar esse trava-língua, única coisa que conseguia falar sem gaguejar, em toda conversação. Eu, com meu couscous marroquino, sou meio feito o gago. Não tem festa aqui em casa sem ele, o povo me cobra e eu acabo tendo que arranjar jeito de enfiar o couscous na conversação.

Meu couscous começa com o caldo. Na lista de especiarias abaixo, você vai notar que não tem quantidade especificada. O negócio não é marroquino? Então! Sacode esses frasquinhos de especiarias com vontade, mete a colher lá dentro, sem medo, porque o que você vai querer é que sua cozinha cheire a Marrocos. Ainda não fui lá – ainda, vou logo! – mas o cheiro de Marrocos que habita o meu imaginário é esse que invade a minha cozinha quando faço couscous.

A base vai ser um caldo de legumes. Tem uma receita boa de caldo caseiro aqui. Se tiver um desses, é a perfeição, mas se não tiver caldo caseiro, pode usar dois sachés de caldo industrializado mesmo, que ninguém vai morrer de câncer só por isso e nem ser queimado na fogueira dos cozinheiros hereges. Então é assim:

Para o caldo de especiarias:

1,5 litro de caldo de legumes caseiro já salgado (ou 1,5 litro de água e dois sachês de caldo pronto)
3 dentes de alho, cortados ao comprido
5 folhas de louro
3 paus de canela
curry
páprica picante
grãos de pimenta do reino, branca e rosa
pimenta síria
zaatar
cardamomo
cúrcuma

Misture isso tudo (é tipo caldeirão da bruxa mesmo, só falta ter perninha de aranha) e leve ao fogo. Quando ferver, deixe uns 10 minutos, para fazer uma infusão das especiarias.

Para o couscous:
250g de couscous marroquino (meia caixinha: couscous rende à beça. Isso vai servir 4 pessoas, com folga).
150g de lentilha lavada e escorrida
1 cebola grande, picadinha
canela em pó
uvas passas claras (a gosto)
damascos fatiados (a gosto)
tâmaras fatiadas
salsa
cebolinha
pimenta do reino
azeite
limão siciliano e/ou tahiti (depende da acidez que você deseje: menos ácido, siciliano)
amêndoas tostadas.

Pré-cozinhe a lentilha em uma parte do caldo de especiarias. Quando ela ainda estiver bem firme, al dente, escorra o caldo em um recipiente. Reserve.

Refogue a cebola em azeite. Quando a cebola estiver transparente, acrescente a lentilha pré-cozida e a pimenta, canela, refogue bem. Junte as passas, tâmaras e o damasco, acrescente o caldo reservado, aos poucos, até terminar o cozimento da lentilha (que não deve ficar cozida demais, o ponto ideal é ainda al dente).

Ferva o caldo restante e vá acrescentando, aos poucos, ao couscous, de forma a umedecê-lo, mas sem deixar sobrar caldo acima do couscous. É umedecer lentamente mesmo, senão o negócio vira uma papa. Vá mexendo sempre com um garfo, para não deixar criar pelotas. Quando estiver úmido (mas também al dente), regue com azeite, misturando com garfo. Tampe e deixe abafadinho por alguns minutos. Adicione a lentilha refogada. Nessa hora, eu costumo acrescentar mais canela, curry e páprica, se acho necessário. Corrija também o sal. Adicione raspas da casca do limão siciliano e caldo de limão a gosto (até chegar ao ponto de acidez que te agrade). Finalize com salsa, cebolinha e amêndoas tostadas picadas.

Dica 1: Para quem mora no Rio e não sabe onde comprar as especiarias, dê um pulo no Saara, entre numa Casa Pedro e se perca lá dentro. Tem Casa Pedro em outros pontos da cidade, mas no Saara é bem mais divertido. E é barratinho! Se estiver com preguiça de sair de casa, pode comprar aqui, nesse site bacana que a Angela me apresentou e que mantém uma página linda aqui no Facebook: .

Dica 2: Se escolher o Saara, dá pra peneirar umas bijous baratinhas. A regra de ouro é comprar na primeira meia hora, antes que a vista acostume com o monte de coisas, digamos, exóticas, que você vai achar por lá. Já me vi, no dia seguinte a uma ida ao Saara, cheia de bijouterias que me faziam questionar minha própria sanidade mental.