E eu que andei falando sobre deixar de lado as paixões, logo eu. Logo eu, que acredito no que dizia, mas que não sei viver sem paixão. Logo eu, apontada a todo instante como passional.
Andei tentando vestir fantasia menos vibrante, mas aconteceu que ontem a paixão me visitou e foi bom ter com ela e sentir o corpo tremer, dançar até a madrugada pela sala, levada pelos braços da paixão. Escolhi trilha vermelha para nos embalar e cantei alto e me dei conta de que rejeito uma vida sem paixão. Assim como rejeito a cegueira. A paixão que cega, a que não discerne entre bem e mal, aquela que se avizinha ao ódio e com ele estabelece diálogo natural, essa eu rejeito, sempre rejeitei. Mas a paixão pelos ideais que me movem, a mim e àqueles com quem escolho bailar, aquela que faz brotar em nós, involuntariamente, o arrepio, o tremor, o riso e a lágrima, todos juntos, aquela que nos faz lembrar quais eram nossas motivações iniciais mais nobres, antes que ficássemos confusos e embaralhássemos as motivações com os veículos em que as depositamos, aqueles mesmos veículos que nos deixaram à beira de uma estrada, no meio do caminho; com essa paixão seminal eu quero dançar pelos bailes da vida, enquanto a vida me der força para dançar. Essa eu celebro, para essa eu me visto inteira de vermelho – vermelho paixão -, da cabeça aos pés, por dentro e por fora, para brindar a ela e com ela dançar e dançar e dançar e dançar!
Vi tanta gente dançando ontem e me lembrei de mim nos bailes de outrora. Lembrei de mim debutante dançando nas ruas, nas praças, porta-estandarte carregando bandeira, crença, ideal e esperança. No baile de ontem tinha muita gente de coração ferido, mas era gente fênix, que preza asas, que renasce das cinzas, que deixa a desilusão nas cinzas e segue voando, sabendo que algumas paixões precisam ser mantidas, precisam ser alimentadas, apesar das feridas. É esta a paixão que eu celebro: a que alimenta a esperança, a que nos faz retornar a nós mesmos, a que nos faz manter viva a esperança em nós, a que é chama acesa em torno dos ideais que valem, que sempre valerão. Paixão que nos sacode e esfrega na nossa cara que se alguém deixa a esperança morrer, é porque não tem esperança em si mesmo.
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