Jamais houve quem costurasse fantasia alegre como Maiakovski. Não sei costurar poentes, mas tenho uma blusa amarela, quase cor de gema. Se nela costuro flores, saio por aí fantasiada de poeta. Por um dia e através do poente, serei Maiakovski. Por um dia e através do poente, minha anatomia terá direito à sua loucura censurada todos os dias pelo não-amor. E quando se tiver ido o poente e a lua pratear meus olhos, a blusa amarela bordada de flores terá me feito eu: serei toda coração.

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Blusa Fátua
(Vladimir Maiakovski)

Costurarei calças pretas
com o veludo da minha garganta
e uma blusa amarela com três metros de poente.
pela Niévski do mundo, como criança grande,
andarei, donjuan, com ar de dândi.
Que a terra gema em sua mole indolência:
“Não viole o verde de as minhas primaveras!”
Mostrando os dentes, rirei ao sol com insolência:
“No asfalto liso hei de rolar as rimas veras!”
Não sei se é porque o céu é azul celeste
e a terra, amante, me estende as mãos ardentes
que eu faço versos alegres como marionetes
e afiados e precisos como palitar dentes!
Fêmeas, gamadas em minha carne, e esta
garota que me olha com amor de gêmea,
cubram-me de sorrisos, que eu, poeta,
com flores os bordarei na blusa cor de gema!

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Nos demais – eu sei,
qualquer um o sabe –
O coração tem domicílio
no peito.
Comigo
a anatomia ficou louca.
Sou todo coração –
em todas as partes palpita.

Trecho do poema Adultos,
(Vladimir Maiakovski)