Olhei o par de micos sobreviventes, lá nos galhos mais altos da árvore. Foram os micos e os pássaros boa parte do motivo de ter vindo eu parar aqui, neste lugar que me era desconhecido, mas onde um dia abri janelas e me senti em casa, onde achei que poderia ser feliz, vendo só verde e montanhas, qualquer que fosse o canto de dentro de casa. Aqui seria bom lugar para saudar o sol, manhã cedinho, dia após dia. Desde então – e faz tão pouco tempo – já derrubaram tantas árvores e desabrigaram tantos micos e pássaros! Os pássaros ainda pousam nas janelas e na tela da varanda, fazem voo alegre pelos vasos de planta, visitam minhas flores e as espalham por aí, onde nem sei; roubam, no bico, as fibras dos vasos de coco, que eu cedo feliz para que construam seus ninhos… mas nunca mais contei mais de trinta pássaros, de uma só vez, e quando cheguei, não faz muito tempo, era assim. A vista mudou e hoje vejo, não muito longe, algumas construções.
A árvore em que estavam os micos de hoje é aquela que fica ao fundo do terreno vizinho, aquele que era povoado somente por árvores e cantos de grilos e sapos, o mesmo terreno onde agora se ergue mais um prédio. Será baixo, me dizem, e não me importa sua altura: nascesse com qualquer altura, teria derrubado as mesmas árvores e desalojado os mesmos micos, pássaros, grilos e sapos. Dizem-me que é bom, nossos imóveis estão mais valorizados. A essa altura, já estou acostumada a discordar dos valores dos homens.
A árvore que restou abriga os micos que tiveram seus caminhos interrompidos e não sabem direito para onde ensinar seus filhotes a pular. Aquela árvore quase solitária fica quase em cima da gigantesca pedra que foi descoberta em meio às escavações do terreno, a pedra que impediu a derrubada total das árvores. Como fui grata à pedra, naquele dia de escavações interrompidas! Bendita pedra gigante no caminho, quis abraçar a pedra! Olhei de novo os micos e eles me olhavam nos olhos. Por um momento, senti que éramos cúmplices: eu, os micos e a pedra. Éramos – micos, pedra e eu – um. Tive certeza de que nos entendíamos e achei bacana reencontrar esse tal de Tao.
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