Se eu pudesse, amiga querida, dava jeito de te trazer de volta tua menina. Era já mulher feita e herdou de ti talentos, mas era ainda tua menina, como somos todas nós aos olhos dos ventres que nos geraram. Se pudesse, massageava teu coração e pressionava com meus dedos os pontos certos, aqueles que trazem alívio às dores, como fazemos com pés cansados. E bem sei como deve andar cansado este teu coração, vindo da jornada tão longa a ele imposta, percorrendo áridos desertos. Se pudesse, fazia com que fosse proibido que qualquer mãe perdesse seus filhos, os que já vingaram ou os que estão por vir, principalmente quando se avizinha o dia delas. Se pudesse, regenerava as células de tua menina, parava a bala que atingiu a outra menina na Linha Amarela, e protegia então teu coração e o dessa outra mãe. Se pudesse, guardava os corações de todas as mães em lugar seguro, pois que são o lugar mais brilhante da Terra. Principalmente perto do Dia das Mães. Porque o dia, então, que deveria ser só celebração do amor maior, para algumas passa a ser realização da falta, da ausência, dia de dar-se conta de que um pedaço de si foi extirpado e sentir parte do coração mutilado, a parte que virou vazio e que não se sabe com que preencher. Se pudesse, enchia esse teu vazio de luz e de calor, mas sei que não posso. Por enquanto, nada e ninguém pode. Por enquanto, nós, que te queremos bem, só podemos acolher tua dor e esperar que o tempo e a vida te façam carinhos como os de pais, que te deem colo, te ninem, te acalantem e te façam recuperar o compasso de tua própria respiração, depois dos longos soluços da perda. Aí então, com o coração apaziguado, tu poderás continuar a embalar tua menina, que de onde estiver continua tua e certamente precisa, ainda, de teu colo.
Imagem: Mãe e filho. Gustav Klimt. c 1905.
Para todas as mães em quem a maternidade jamais cessa. Para uma, em especial.
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