A prima, no piquenique de família, não larga o celular, postando uma foto atrás da outra nas redes sociais. Em meio a uma postagem, pergunta:
__ Como é que se escreve, piquenique ou pic-nic?
O pai me olha com sorriso maroto e responde, baixinho:
__ Escreve convescote, que é de um tempo em que os piqueniques eram mais elegantes, sem essas parafernalhas eletrônicas alienando todo mundo.

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A mãe vai contando histórias de um passado bem antes de conhecer o pai, até que pinta um namorado na história. O pai vai ficando com ciúmes:
__ Quem era esse namorado, que frequentou a casa de sua mãe? Nunca soube dele.
__ Um namorado que eu tive antes de você, ora.
__ E ele ia muito lá?
__ Ia, ora, era meu namorado.
__ E dormia lá?
__ Sim.
__Onde é que ele dormia?
A mãe pisca o olho pra mim e responde:
__ Dormia comigo, no meu quarto.
O pai pisca o olho pra mim e responde, com ar blasé:
__ Então não era de nada, não, esse sujeito, que se fosse eu não tinha conhecido sua mãe como conheci.

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Minha irmã e o namorado (hoje marido) tinham terminado o namoro. Domingo, família à mesa, bate-papo longo depois do almoço, como a gente fazia aos domingos, ouve-se o então ex, lá de fora, chamando no portão:
__ Bia!!! Bia!!! Bia!!!
Minha irmã deixa a mesa, corre para o portão. O pai faz um ar de “sei não…” e manda, olhando para o prato de sobremesa:
__ Esse é atleta.  O clube já dispensou, mas continua vindo treinar todo santo dia… Bem verdade que ele entra no treino porque alguém deixa o portão meio aberto… (e sorri).

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Era carnaval, eu por volta dos 20 anos, viajando com a turma da faculdade. À noite, a gente ia para a praça lotada da cidade de praia, toda calçada de pedras. Eu vejo as fotos e me pergunto como é que eu gostava daqueles programas 5 machadinhas (cotação máxima de programa de índio). Como é que a gente usava aquelas saias tão curtas?! Todo mundo dançando animado: “Tchaco, eu tô em cima, eu tô embaixo” (pois é, não adianta que ninguém passou incólume pelos carnavais da época de faculdade). No meio da agachada coreografada do “tô embaixo”, o sujeito atrás de mim, praticamente um gigante, resolve se agachar e, de costas para mim, sem querer, me dá uma bundada tão forte que eu caio quase de cara no chão pedrento e imundo da praça. Meu rosto acaba se salvando, mas os joelhos, cotovelos e antebraços viram uma ferida só. Volto de viagem e o pai me olha naquele estado, toda machucada:
__ Minha filha, eu devo perguntar como é que você foi parar nessa posição, pra ficar toda ralada aí nos joelhos e cotovelos? E quanto eu devo me preocupar com esse seu carnaval?

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Eu arrumava a mochila para a viagem e ele ia me levar até o ponto de encontro. Quando pegava a mochila, que naquela época tinha umas cinco opções de looks por noite, ele dizia:
__Você não aguenta carregar isso! Que eu carregue esse peso todo, vá lá, sou seu pai, mas o sujeito que carrega isso quando você chega lá, pode contar: tá apaixonado.

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Ele passa tempos até notar, mas finalmente bate o olho em meu ombro tatuado e faz cara de surpresa:
__ Você mandou fazer isso?!
__ Sim, pai, pra seu desgosto, né?
__Pagou pra fazer?
__ Sim, pai.
__Mas é dessas que saem quando lavar, né?
__ Não, pai.
(O pai sempre odiou tatuagens, não pode ver alguém tatuado passando por ele, que suspira: “Que ideia horrível, se rabiscar assim…”). Ele continuava meio pensativo. Insisti:
__ E aí, pai? Você não gostou, né? Não gosta mesmo.
__ Nos outros, não gosto mesmo, não, mas em você achei bem bonito. Em você, tudo fica bonito. Sorri.

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Não tem como não amar demais.