Aqueles que amam os livros e testemunham, impotentes, o fechamento de livrarias e espaços literários, veem a si mesmos acuados, postos para escanteio, sem lugar num mundo que parece querer nos expurgar. Inadaptados que somos, sentindo-nos estranhos, estrangeiros, esquisitos, até, vamos nos contentando com migalhas. Quando vi as duas páginas do Prosa (não mais Verso, que pena!), agora inseridas no Segundo Caderno, pensei: antes duas páginas que nada. Mas é com enorme tristeza que faço essas constatações.

Foi muito em função disso que decidi criar o Sabores DiVersos. Se conseguir, aqui, despertar o amor pela leitura em uma única pessoa, este espaço já se justifica, porque se essa única pessoa realmente desenvolver o amor pela literatura, há de criar descendência. Segundo Mario Vargas Llosa, “Se queremos evitar o desaparecimento dos romances – ou sua restrição ao sótão dos objetos inúteis – e com isso o desaparecimento da própria fonte que estimula a imaginação e a insatisfação, que refina nossa sensibilidade e nos ensina a falar com eloquência e precisão, que nos torna livres e nos garante uma vida mais rica e intensa, então devemos agir. Precisamos ler bons livros e incitar à leitura os que vêm depois de nós.”.

Tenho dezenas de alunos universitários que nunca leram um livro não técnico, exceto aqueles a que foram obrigados no colégio, quando o foram; ainda assim, literatura não deveria ser imposição desprazerosa. Ainda de acordo com Llosa, “Nenhuma disciplina substitui a literatura na formação da linguagem. O conhecimento transmitido por manuais técnicos e tratados científicos é fundamental, mas eles não nos ensinam a nos exprimir corretamente. Ao contrário, com frequência são mal escritos porque os autores, às vezes expoentes indiscutíveis em sua profissão, não sabem transmitir seus tesouros conceituais.”.

Ao questionar meus alunos sobre seus parcos hábitos de leitura, alguns confessam não saber, sequer, por onde começar. Há muitos que nunca tiveram estantes em casa, não tiveram predecessores que os pudessem guiar no mundo da literatura. Seus pais já fizeram muito, conseguindo ingressá-los em universidades, contra todas as regras do jogo estabelecido. O fechamento de canais como o Prosa e Verso representa isso: a escassez de predecessores, a escassez do desenvolvimento da sensibilidade e da formação do pensamento crítico. A escassez de libertação.

O mundo em que vivemos vai se tornando, para alguns, cada vez mais excludente. É preciso que todos tenham direito a eletrodomésticos, mas, mais que isso, é preciso que haja libertação interior, aquela que só a iluminação produz. Do texto de José Castello, que segue: “É o mundo do Um _ em que todos dizem as mesmas coisas, usando quase sempre as mesmas palavras. Um mundo em que a verdade, que todos ostentam, de fato agoniza. Nesse universo, a literatura se impõe como um reduto de resistência. A literatura é o lugar do diálogo, do múltiplo, da diferença.”.

Leia a despedida de José Castello